EU TAMBÉM VOU RECLAMAR

(Por Rafael de Novaes Rocha, Editor do QUINTAL)

Nestes tempos de dominância das redes sociais, tornou-se praticamente obrigatório que todos tenham opinião formada sobre absolutamente tudo. Desde o buraco na esquina da rua da padaria à manutenção da taxa SELIC; da maratona de shows da banda internacional no Brasil à pneumonia do Presidente. Pois então, aproveitando novamente a oportunidade nesta ágora cruzeirense e relembrando o imortal Raul Seixas, eu também vou reclamar, afinal, este último mês nos deu motivos de sobra para nos queixarmos.

Na minha última participação nestas bandas, havia pedido paciência aos torcedores e confiança no processo do trabalho de Ronaldo e seus gestores; o famoso bordão/alerta “torcedores, calma!”. Mas paciência tem limite e então, pergunto: será que já atingimos este teto de tolerância?

Recapitulando o primeiro trimestre desastroso capitaneado pelos gestores de Ronaldo. Com profissionais gabaritados e antenados nas movimentações mais minuciosas do mercado da bola, fizemos um excelente trabalho de scout na busca por bagres, pernas de pau e refugos que sequer seriam titulares na Série B de 22. E vamos por mais: a cada especulação, é um novo frio na espinha. As contas no vermelho viraram muleta para contratações duvidosas e para o negacionismo delirante – não precisamos de novos reforços e o material humano que temos é suficiente para termos um time competitivo no Brasileirão. Resultado: o pior aproveitamento entre os times da Série A até agora.

Depois, os experts em gestão esportiva compram uma briga infinita com a Minas Arena e resolvem mandar os jogos do time em quaisquer estádios do planeta Terra, exceto na Pampulha. Resultado: perdemos mais de vinte mil sócios e temos ZERO vitórias como mandante até agora.

Por fim, o Cruzeiro fez a pré-temporada mais longa da história (desde meados de dezembro), montou seu elenco competitivo (?) com base nas orientações de Paulo Pezzolano e moldou seu projeto desportivo do ano às vontades do treinador uruguaio. Eis que em março cai a bomba: Papa Pezzolano pede para sair; ainda sem ninguém entender, horas depois, cai a bomba “Fat Man” sobre a Toca 2: Pezzolano tinha planos de sair desde DEZEMBRO, e a diretoria, já sabendo disso, tinha nomes substitutos engatilhados desde então. Mesmo assim, mantivemos o técnico demissionário por todo valioso tempo de início de temporada. Resultado: iniciaremos o Brasileirão mais importante de nossa história com um novo técnico, sem saber muito bem em que lugar ele se encontra na “Escala Paulo Bento de Professor Pardal”.

É verdade que o Campeonato ainda nem começou e alguns torcedores desesperados e jornalistas “imparcialíssimos” já nos dão como rebaixados. É fato também que nenhum time no Brasil – salvo Palmeiras e Fluminense – anda jogando um futebol de encher os olhos, muito pelo contrário, inclusive. Mesmo assim, caberia um mea culpa à diretoria de Ronaldo, para reconhecer a sucessão de erros deste início de ano. No entanto, a cada cobrança da torcida o Patrão se comporta como um menino que acaba de ser contrariado no chat de um jogo online. Ninguém pode cobrar, porque ninguém sabe como é difícil gerir um clube. A distância da torcida se escancarou com a troca ridícula do Raposão. Ninguém pediu e ninguém gostou.

Boa vontade com o projeto de Ronaldo não faltará, porém os sinais seguem muito desanimadores. Mudanças são necessárias. Ninguém disse que seria fácil, mas a diretoria cruzeirense, com toda a sua pompa, poderia não dificultar ainda mais o processo. Melhor o Ronaldo se acostumar com o tamanho da instituição e valorizar o nosso patrimônio mais importante: a torcida. Afinal, o Cruzeiro não é e nunca vai ser Valladolid. Espero que abra os olhos antes que seja tarde demais…

BATE PAPO NO QUINTAL

1. Cruzeiro 3 x 2 Red Bull Bragantino – Com paciência e garra, o nosso Cruzeiro venceu de virada, revertendo um resultado de dois gols de diferença. Devemos ver o copo meio cheio ou meio vazio? O resultado final e o bom futebol no segundo tempo devem se sobrepor ao blackout total de nosso sistema defensivo nos primeiros minutos de jogo? De novo, falhas de Lucas Oliveira e Rafael Cabral. O emocional dos jogadores ficou abalado com dois gols tomados tão precocemente e o resultado do primeiro tempo acabou saindo barato para nós. No intervalo, Pepa soube motivar o time, que entrou mais ligado no segundo tempo. Quase completamente modificado, os jovens da base deram um novo gás àquele time sonolento dos primeiros quarenta e cinco minutos – destaque para Stênio, Kaiki e Daniel Jr. Tivemos raça para encontrar o primeiro e suado gol, anotado por Vital e, no embalo, nosso lateral campeão sul-americano, Kaiki, sofreu pênalti, bem convertido por Machado. Este, inclusive, é um jogador que merece todo sucesso em campo, por sua entrega tática e física e por todos os problemas de saúde que sofreu nos últimos tempos. Um guerreiro. Merecidamente, anotou um belo gol de letra, sacramentando a virada celeste.

Destaque, também, para a nossa torcida, que, como sempre, compareceu em peso ao estádio. Em uma quarta-feira. Em Bragança Paulista. Para apoiar o time incondicionalmente em um amistoso. Isto é Cruzeiro.

Considerando que este jogo não vale nada, tomara que a vitória, com este script, nos dê um novo ânimo e novas energias para a sequência difícil da temporada. Pepa deu um bom cartão de visitas. Falta saber se conseguirá mudar os nossos velhos problemas.

2. Sorteio da Copa do Brasil – O Cruzeiro terá pela frente o Náutico, na terceira fase da Copa do Brasil. Será o primeiro jogo oficial de nosso Mister Pepa. O time pernambucano foi o lanterna da Série B no ano passado, amargando duas derrotas para o Cabuloso. Dentre os possíveis adversários no sorteio, não foi o pior, como seriam Sport, Ituano ou ABC, mas também não entra na categoria de molezas. A previsão é que o confronto com o Náutico seja duríssimo. É um clube tradicional, com grande torcida e chato de se enfrentar. Lembremos do confronto com o Remo, no ano passado, que estava em condições parecidas com as do nosso atual adversário, com a diferença que o nosso time estava voando. O Cruzeiro não perde para o Náutico desde 2009. Que tal mantermos este tabu do bem, Pepa?

3. Olivia Vieira – quem diria – calcula que muito tempo passará antes que o Cruzeiro retome seu lugar no futebol mineiro (abaixo do Atlético, claro). Confessa torcer pra que esse tempo seja exageradamente longo.

Minha cara Olivia, você comete o que os psicólogos chamam de “ato falho”: de tudo o que tememos muito, somos levados a, sem perceber, fantasiar uma distância que nos afaste indefinidamente…

Foram dezenas de anos de gloriosa hegemonia azul no futebol brasileiro fora do eixo Rio-São Paulo, quando brotaram as páginas heroicas, imortais… muita mágoa do lado de lá… muita ferida não cicatrizada… A gente entende isto. Agora mesmo, no sorteio de grupos para a Libertadores, com o Atlético, e o sorteio da Sul-Americana, com o América, a ausência do Cruzeiro foi lembrada até com foguetório. Sim, acompanhamos do sofá, mastigando uma invejinha. Mas e os atleticanos, há meio século?

Minha cara, há decênios o Cruzeiro brilhava sozinho nessas Minas Gerais. A alegria atleticana, com passeata na Savassi, era festejar adversários que nos venciam. Você sabe disto. Temos gordura pra queimar.

4. Obrigado, Amigos! – Entre pancadas e rasteiras, desacostumei-me a ter o ego massageado. É estimulante!

5. Censura no QUINTAL– Com a compreensão de todos, inclusive dos juvenis, os comentários do Bate Papo já podem ser lidos sem provocar engulhos. Mais uma vez, Obrigado, Amigos.

6. Jorge – inspirado pelo raríssimo alinhamento de cinco planetas e a Lua – redigiu texto alentado, sociológico e antológico, sobre a Odisseia do QUINTAL. Teobaldo chegou a suspeitar que Jorge seria fake de Fred Melo Paiva. Mais ou menos assim: você escreve um texto e o cara pensa que você transcreveu Guimarães Rosa ou Eça de Queiroz… O retrospecto costurado por Jorge é coisa pra integrar compêndios universitários dependendo apenas de uma correção a ser feita pelo autor. O trecho sub judice é este:

“… O Blog do Dalai não merecia isso. O lugar onde mais se discute o Hulk na imprensa brasileira; o lugar onde aprendemos existir o “VAR do bem” e o “VAR do mal”, onde descobrimos que a pandemia fez estragos seletivos em clubes de futebol…”

O nó górdio é esta expressão safadinha, de aparente inocência, mas com potencial pra esconder tsunami:

– “descobrimos que a pandemia fez estragos seletivos”

Meu caro Jorge, que amnésia “seletiva” é esta que te leva a esquecer de uma calamidade chamada “Administração Wagner Pires” que arrasou o Cruzeiro antes da Covid 19 chegar? Não restou pedra sobre pedra.

Quando a pandemia mundial chegou, pegou todos os clubes em pé.

Só um na lona, nocauteado.

Óbvio, assim, haver “estragos seletivos”. Consumimos dois anos só catando cacos. Podemos excluir do seu texto aquelas seis gotas de veneno e mandar logo imprimir?

7. JCSR aplaudindo o QUINTAL sem baixarias:

“Muito gratificante voltar a comentar em um ambiente sadio. A proporção de ofensas e palavrões de uma certa forma impedia os mais sérios de um debate interessante.”

8. Antônio, externando premonição que – exceção da massa alvinegra – é de todo torcedor mineiro:

“Há décadas a paixão atleticana domina os bastidores da FMF. Tadinho do América, a próxima vítima.”

Esse domínio já dura mais de meio século.

9. Mão Grande confirmada! – A propósito de arbitragem, o órgão oficial da FMF acaba de decidir pela suspensão temporária do arbitro que não assinalou pênalti a favor do Athletic, no jogo em que empatou em 1 x 1 com o Atlético. No julgamento, é esclarecido:

“Entendemos que se trata de um erro isolado, apenas do árbitro da partida. (…) Entendemos que o árbitro de vídeo foi preciso, pontual e assertivo ao recomendar uma revisão e que o erro foi puro e exclusivo do árbitro da partida que, equivocadamente, entendeu como não falta e considerou tratar-se de um movimento natural do goleiro do Atlético”.

Nenhuma novidade no front.

10. Eduardo Silva, historiador investigativo, descobriu que em novembro de 2022, pós demissão de Cuca, a diretoria do Atlético se fixava em dois nomes: Vojvoda e Pepa. Os repórteres Raisa Simplicio e Thiago Fernandes, no dia 3 de novembro do ano passado, cravavam:

“Outro nome que interessa (ao Atlético) é o do português Pepa, atualmente no Al-Tai, da Arábia Saudita. O treinador, considerado um dos grandes nomes da geração, foi alvo do Santos, em 2021. Na ocasião, o técnico optou por seguir o trabalho que fazia no Paços Ferreira e rejeitou a oferta do Peixe.”

Imaginem, há menos de um ano o Atlético queria trazer o Pepa. Hoje o Cruzeiro trouxe. Os atleticanos, de memória curta e pra dar gozeira absolutamente sem graça, insistem em perguntar – “Isto é nome de treinador?” –

E Cuca é nome de treinador?

Meus amigos, sem uma dose mínima de bom senso a gente só paga bobeira.

11. Serafim Couto Spindola reclama do distanciamento da torcida com o clube:

“Sou cruzeirense há mais de 50 anos, ensinei minhas filhas a torcerem para o Cruzeiro. Meu neto, mesmo pequenino, Cruzeiro rebaixado, é torcedor azul. Entendo que o nosso maior problema é o distanciamento da torcida com o time. Nosso local de jogar é a Toca-3, o Mineirão. Lá, os outros times tremem. Conseguimos colocar 60 mil torcedores fanáticos pelo Clube. Isso faz a diferença”.

Você tem toda razão, Serafim. Esperamos que Ronaldo esqueça o Raposão e se lembre do Mineirão.

GARIMPO

“Ainda me lembro do primeiro presente que ganhei. Alguém pôs em meu berço um ursinho de verdade”;

“Meus pais não tinham dinheiro pra me comprar um cachorro. Então me levaram a uma loja de animais e me compraram uma pulga. Eu a chamava de Manchinha.”

(Woody Allen)

Homenagem ao historiador Manuel Panhame que reabriu o recreio infantil na última coluna.